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E as crianças, quem se importa com elas?
Posted by Cottidianos
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21:51
Domingo,
03 de setembro
“Criança
feliz, que vive a cantar
alegre
embalar seu sonho infantil
ó
meu bom Jesus, que a todos conduz
olhai
as crianças do nosso Brasil!
Crianças
com alegria
qual
um bando de andorinhas
viram
Jesus que dizia:
Vinde
a mim as criancinhas!
Hoje
dos céus num aceno
os
anjos dizem amém
porque
Jesus Nazareno
foi
criancinha também!”
(Canção
da Criança – composição: Lúcia Helena)
É
certo.
É
certo que imprensa brasileira dê grande destaque a maior operação investigativa
da história do país: a Operação Lava Jato. Uma operação policial que mostrou ao
Brasil a face mais perversa da relação empresários-Estado-políticos. Investigação
essa que revelou à sociedade o criminoso esquema escondido na base da política
brasileira, na qual estão envolvidos grandes empresários e partidos políticos de
destaque nacional, bem como figuras aclamadas pela sociedade, e até o desfecho
da operação policial, tidos como homens e mulheres nos quais se depositava
alguma esperança de futuro para o Brasil. A corrupção, espalhou-se pelas três
esferas do poder: Legislativo, Executivo e Judiciário. As mentes criminosas operam
no Executivo através do superfaturamento de obras, e demais serviços
contratados pelo estado e por empresas ligadas a ele. O Legislativo é dama
bondosa que trabalha para os grandes grupos empresariais formulando leis que
beneficiam diretamente a esses grupos, mesmo que os interesses destes sejam
diametralmente opostos aos interesses da sociedade brasileira. Nessa relação
entre a dama, poderosos grupos empresariais, e interesses do povo, fala mais
alto o dinheiro ofertado pelos poderosos à bondosa dama.
É
certo o esforço da luta do Judiciário, do Ministério Público, da
Procuradoria-Geral da República, da Polícia Federal, no combate a essa praga
que se alastrou pelos quatro cantos do país. O esforço de bravos ocupantes de
cargos destas instituições, mesmo a despeito da falta de vontade dos políticos
em colaborar para a extinção desse mal que é a corrupção, tem dado resultados
muito positivos para a sociedade brasileira. Dentre esses resultados, podemos
citar os acordos de cooperação internacional que têm ajudado a repatriar
milhões de reais que descansavam sossegadamente em paraísos fiscais; os acordos
de colaboração premiada que, mesmo sendo criticados por muitos, tem ajudado a
desvendar a ponta do novelo desse intricado e complexo esquema de corrupção; o
fortalecimento do judiciário e independência do poder judiciário; arrojadas
investigações por parte do Ministério Público, da Polícia Federal, e da Receita
Federal; além de mostrar à sociedade a podridão na qual está envolta o meio
político.
É
certo que a sociedade brasileira, de um modo geral, acompanhe com interesse e
indignação, as investigações e as consequências da Lava Jato, e a partir disso,
forme suas opiniões e tenha sobre a situação uma visão crítica.
Não
é certo.
Não
é certo que os parlamentares estejam a todo o momento querendo votar leis e
fazendo manobras que prejudiquem o bom andamento das investigações a fim de
abafar a Lava Jato, ou até mesmo extingui-la. Em Julho, ao apresentar à Justiça
Federal de Curitiba, denúncia contra o ex-presidente Lula, por obras no sítio
de Atibaia, os procuradores da força tarefa da Lava Jato disseram que há indícios
estarrecedores de crimes praticados pelo presidente Michel Temer, e pelo
senador Aécio Neves. Na ocasião, eles afirmaram também, através de nota à
imprensa, que, mesmo após três anos de investigações, a cúpula da política
brasileira, trama às escondidas, a anistia aos crimes por eles mesmos
praticados, e ainda por cima, tentam colocar amarras nas investigações a fim de
emperrá-las, bem como associar-se a agentes públicos com as mesmas finalidades.
Segundo o MP, assim agindo, ficam esses políticos desonestos, de mãos livres para
poder desviar o dinheiro dos brasileiros, mesmo em tempos de crise, usando como
escudo para tal finalidade o foro privilegiado, e a imunidade parlamentar.
É
muito certo a ampla cobertura da imprensa, é muito certo o esforço de juízes,
policiais federais, e procuradores, é muito correto o interesse da sociedade em
toda essa situação. É desprezível a atitude dos políticos em querer que nada mude
que tudo continue como antes, e que eles mantenham o status quo, e as
mordomias.
Tudo
isso posto, que pese a balança para o lado da justiça.
Mas
alguém já parou para pensar que poderemos nos tornar um país sem futuro?
Sim,
pois se partirmos do pressuposto de que as crianças de hoje serão o Brasil de
amanhã, e que pouco se tem falado delas, e pouco se tem feito por elas, onde
está o futuro do Brasil hoje, senão caído no esquecimento.
É
claro que as crianças ainda não conseguem formular conceitos maduros de
democracia, de corrupção, de desvio de dinheiro público, mas elas têm ouvidos
para ouvir, e olhos para ver, e para ler as notícias do que acontece em nosso
país. Mesmo nas rodas de conversas em casa, ou na escola, elas, de algum modo,
estão internalizando tudo isto. E se elas começam a achar normal, e natural a
atitude de mentir, corromper, roubar? Se isso acontece, então o caos se
instalará no país e, no futuro, não passaremos de uma república de bananas, ou
de uma nação de idiotas que pensam que, levando vantagem em tudo, conseguem
chegar a algum lugar.
Em
21 de julho deste ano, a Fundação Abrinq — organização sem fins lucrativos que
promove a defesa da criança e do adolescente — lançou o Panorama Nacional da
Infância e da Adolescência, no qual revela que 2, 6 milhões de crianças e
adolescentes brasileiros, entre 5 e 17 anos, vivem em situação de trabalho
infantil. Ainda segundo a pesquisa da Abrinq, 8,5 mil crianças, entre 5 e 9
anos, ingressaram nesse universo em comparação aos anos de 2014 e 2015.
Outro
dado preocupante apontado pelo Cenário da Infância e Adolescência – 2017, é o
de que 17, 3 milhões de crianças, entre 0 e 14 anos vivem em domicílios de
baixa renda. Esse número equivale a 40,2% da população brasileira para essa
faixa etária.
Segundo
a pesquisa, as regiões Nordeste e Norte do país lideram em número de pessoas
que vivem com renda mensal ou inferior a meio salário mínimo. No Nordeste
brasileiro são 60% das crianças vivendo em famílias com essas condições, e no
Norte, 54%. De acordo com a Abrinq, 5,8 milhões de crianças, entre 0 a 14 anos
de idade vivem nessa situação. Traduzindo em miúdos, 13,5% das crianças
brasileiras nessa faixa etária vivem em extrema pobreza.
Da
violência, os pequenos também não escapam. Segundo a pesquisa da Abrinq, quase
18% dos homicídios praticados no país, são cometidos contra crianças e
adolescentes, pouco mais de 80% deles com armas de fogo. Sendo o Nordeste, a
região que concentra a maior proporção de crimes cometidos contra a infância e
a adolescência.
Não
desprezemos também o fator televisão, que hoje é mais do que comum na casa do
pobre e do rico, guardada as devidas proporções de conforto de sentar-se em
frente a ela, tanto na casa de um como de outro.
Imagine
o caro leitor, como os processos mentais se desenrolam na mente de uma criança
que vive em extrema pobreza, em cuja família há dificuldade de comprar até
mesmo o pãozinho nosso de cada, regado a uma gostosa manteiga e café. A criança,
está em casa, ou na casa de algum amigo cujas posses já são um pouquinho
maiores. Termina os desenhos animados, que fazem a alegria e a distração das
crianças em qualquer lugar do mundo. Termina um bloco do programa e entra o
intervalo comercial.
A
criança, muitas vezes, nem tomou sequer o café da manhã, ou se tomou foi aquele
café mirrrado. E as imagens de comidas deliciosas vão surgindo diante de seus
olhos curiosos e de sua barriga faminta. Um fogão se acende. Na boca do fogão,
uma panela. Nela, uma mão começa a derramar um doirado azeite. Uma cebola é
partida ao meio. Uma pitada de sal é jogada na panela. Em seguida se abre, como
que por mágica, o forno do fogão, e, dentro dele, está um peru bem tostado, bem
assado, e, beirando a travessa na qual ele foi assado, verduras suculentas.
Imagine
o leitor, leitora, como tudo isso se processa na cabeça da criança.
Idem
para os comerciais que exibem carnes de primeira, enquanto em grande dos lares
brasileiros, principalmente, nas regiões Norte e Nordeste, a comida na mesa é
apenas um pouco de feijão e nada mais.
Indo
mais além, como será que é visto as notícias de corrupção praticadas pelos políticos
na casa dessas pessoas, e na cabeça dessas crianças? Estarão elas tão
anestesiadas pela fome e pelo abandono que chegam a pensar que é boa a mão do
político que só os procuram em épocas de eleição, quando precisam do voto das famílias
dessas crianças? Será que elas consideram heróis aqueles que os traem e roubam
seu futuro? Será que acham muito o pouco que lhes é oferecido em meio à
miséria, falta de boas escolas, e de uma vida digna?
Pense
o leitor, leitora, reflita sobre as malas, sacolas, caixas de dinheiro, cheias
de milhões de reais, circulando pelo país, em meio à alta cúpula dos partidos
políticos e empresários brasileiros, dinheiro ilícito, diga-se de passagem. Pense
na imensidão de dinheiro que são desviados todos os anos dos cofres públicos
para abastecer o bolso de políticos e empresários mesquinhos, nas viagens
luxuosas, presentes magníficos, e vinhos preciosos comprados com o dinheiro do
contribuinte, enquanto na mesa de milhões de crianças Brasil afora, falta o pão
que lhes tirará um pouco da fome. Pense em tudo isso e responda: vivemos em
país justo?
Que
futuro teremos se não dermos escola de qualidade, saúde, esporte, lazer, e
comida para as nossas crianças?
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