0

Justiça feita e promessas vãs

Posted by Cottidianos on 08:56

Segunda-feira, 26 de abril




Mais uma semana começando, muita coisa aconteceu na semana passada e já é passado, e assim gira o moinho da vida. A existência é movimento. Igual ao astro rei. O sol não para descansar. Está sempre a girar interminavelmente. Ele nunca descansa. Nunca tira férias. A vida é exatamente assim: puro movimento. Segundos, minutos, horas, dias, meses, anos, séculos, milênios, tudo também se sucede num girar interminável, de carona na carruagem de fogo que rodeia nosso — diante da grandeza e beleza estonteante do universo —pequeno e humilde planeta.

Nós, os humanos, é que precisamos de férias, descansos, e todas essas coisas que apenas nos lembram nossa condição de seres limitados, e que, como diria Raul Seixas, “só usa dez por cento de sua cabeça animal”. Mas, mesmo assim, somos diretamente afetados pelo movimento da vida, giramos junto com ela, querendo nós ou não. Não podemos estagnar. Prosseguir sempre em frente é o objetivo de todo ser vivente. A maioria das vezes não estamos conscientes de que o viver é uma constante evolução. Claro, tem gente que parece fazer o caminho inverso, em vez de evoluir, involue. Quem age assim, age na inocência, sem saber que serão cobrados por suas atitudes mesquinhas, e triturados pela implacável roda do moinho da vida.

Na onda do movimento da vida, dos fatos, e dos acontecimentos, este blog não poderia deixar de falar do julgamento histórico que ocorreu nos Estados Unidos semana passada.

Na terça-feira, 20 de abril, finalmente, e para alívio de todos, o policial branco, americano, Derek Chauvin, tirou o joelho do pescoço dos americanos que não aguentam mais anos e anos de preconceito, racismo e injustiça. E de quebra, Derek tirou também o joelho do pescoço de todas as pessoas do mundo inteiro que estão sufocando, que não conseguem respirar por causa de tanta opressão. Pessoas essas que, por intermináveis minutos, durante anos, tem gritado que não conseguem respirar, mas, raramente, são ouvidas. Os negros são sufocados, mortos, humilhados, não apenas nos Estados Unidos, mas no mundo inteiro. Aqui no Brasil são frequentes os casos de abusos da polícia para com os negros.

Quase um ano depois da fatídica segunda-feira de 25 de maio de 2020, em Minneapolis, dia em que Derek Chauvin, policial branco, 40 anos, apoiou o joelho sobre o pescoço de George Floyd, negro, 48 anos, por longos e intermináveis 9 minutos e 29 segundos. Após a morte, uma onda de protestos varreu os Estados Unidos como tsunami.

Na última terça-feira, 20 de abril, em um julgamento que durou três semanas, envolveu a audição de 45 testemunhas, e muitas horas de vídeos exibidos no tribunal, um grupo de jurados, formados por sete mulheres e cinco homens, por unanimidade, decidiu que Chauvin é culpado pela morte de Floyd. Desses jurados, seis pessoas são brancas, quatro negras, e duas multirraciais. Os jurados levaram cerca de 10 horas para chegar a essa decisão.

A pena de Derek Chauvin será conhecida dentro de dois meses. Espera-se que o ex-policial seja punido de forma exemplar, até para que outros casos, como o de Floyd, não se repitam. Isso é difícil, pois após a morte de George Floyd outros casos já aconteceram nos Estados Unidos. Mas, certamente, a condenação do assassino de Floyd já é um marco na justiça americana e, espera-se, sirva de parâmetro para outros julgamentos. Dias após a morte de Floyd, durante os protestos, e nos ombros do tio, a filha dele disse: “Meu pai mudou o mundo”. Com certeza, a pequena garota não estava errada. O nome do pai dela já entrou para as páginas de história da luta contra o preconceito. 

Outro fato muito importante para a toda a comunidade internacional, acontecido na quinta-feira, 22, e sexta, 23, apesar de ser um evento online, também teve como foco de atenção, os Estados Unidos. Foi a Cúpula de Líderes sobre o Clima. Mais cedo do que imaginavam os americanos estão descobrindo que a vida sem Donald Trump como presidente, e com Joe Biden na casa branca, vai ser muito melhor.

A questão do clima é uma é tão delicada como um cristal. Afinal, estamos tratando de nossa casa comum: o planeta Terra. O mundo já sente os efeitos das mudanças climáticas. Elas já não fazem mais parte de estudos ou conjecturas sobre o que acontecerá. Já são reais as elevações constantes de temperatura a cada ano, o que, por sua vez, eleva o número de queimadas, secas, e derretimento das geleiras. Apenas para citar algumas mudanças que percebemos e que podem ter consequências graves para o planeta como um todo.

Na verdade, os países ricos não conseguirão atingir a meta para diminuir a emissão de gás carbônico na atmosfera, até 2030, se atitudes enérgicas não forem adotadas agora. Isso de acordo com relatório divulgado em dezembro pela ONU. No evento recente, o presidente Joe Biden reconheceu que o país não está fazendo o suficiente para cumprir a meta estabelecida para diminuir a emissão de carbono na atmosfera, porém, fez o anúncio de metas ambiciosas de reduzir tais emissões em 50% a 52% dessas emissões até 2030.

O caminho é por aí, pois de nada adiantará termos um progresso estrondoso, se não tivermos um planeta para habitar, não é verdade? Lembrem-se que o mundo já foi habitado por seres enormes, gigantes, poderosos. E onde estão eles agora? Nós, sem a Terra não existimos. A Terra sem nós continua linda, bela, soberana, talvez até mais ainda que com a nossa presença. Então, é preciso nos esmerar em cuidados com esse nosso santuário chamado planeta Terra. 



Um dos discursos mais aguardados nesse evento era o do presidente Jair Bolsonaro. E ele até que fez um discurso bem mais moderado que outras ocasiões onde se falou sobre o clima. Pelo menos, dessa vez não passamos vergonha.

O site da Agência Brasil publicou o discurso de Jair Bolsonaro, na íntegra, o qual esse blog agora reproduz:

Agradeço o convite para participar desta Cúpula de Líderes.

Historicamente, o Brasil é voz ativa na construção da agenda ambiental global. Renovo, hoje, essa credencial, respaldada tanto por nossas conquistas até aqui quanto pelos compromissos que estamos prontos a assumir perante as gerações futuras.

Como detentor da maior biodiversidade do planeta e potência agroambiental, o Brasil está na vanguarda do enfrentamento ao aquecimento global.

 Ao discutirmos mudanças no clima, não podemos esquecer a causa maior do problema: a queima de combustíveis fósseis ao longo dos últimos dois séculos.

 O Brasil participou com menos de 1% das emissões históricas de gases de efeito estufa, mesmo sendo uma das maiores economias do mundo. No presente, respondemos por menos de 3% das emissões globais anuais.

 Contamos com uma das matrizes energéticas mais limpas, com renovados investimentos em energia solar, eólica, hidráulica e biomassa.

 Somos pioneiros na difusão de biocombustíveis renováveis, como o etanol, fundamentais para a despoluição de nossos centros urbanos.

 No campo, promovemos uma revolução verde a partir da ciência e inovação. Produzimos mais utilizando menos recursos, o que faz da nossa agricultura uma das mais sustentáveis do planeta.

 Temos orgulho de conservar 84% de nosso bioma amazônico e 12% da água doce da Terra.

 Como resultado, somente nos últimos 15 anos evitamos a emissão de mais de 7,8 bilhões de toneladas de carbono na atmosfera.

À luz de nossas responsabilidades comuns, porém, diferenciadas, continuamos a colaborar com os esforços mundiais contra a mudança do clima.

Somos um dos poucos países em desenvolvimento a adotar, e reafirmar, uma NDC transversal e abrangente, com metas absolutas de redução de emissões inclusive para 2025, de 37%, e de 43% até 2030.

 Coincidimos, Senhor Presidente, com o seu chamado ao estabelecimento de compromissos ambiciosos.

 Nesse sentido, determinei que nossa neutralidade climática seja alcançada até 2050, antecipando em 10 anos a sinalização anterior.

 Entre as medidas necessárias para tanto, destaco aqui o compromisso de eliminar o desmatamento ilegal até 2030, com a plena e pronta aplicação do nosso Código Florestal. Com isso, reduziremos em quase 50% nossas emissões até essa data.

 Há que se reconhecer que será uma tarefa complexa.

 Medidas de comando e controle são parte da resposta. Apesar das limitações orçamentárias do Governo, determinei o fortalecimento dos órgãos ambientais, duplicando os recursos destinados às ações de fiscalização.

 Mas é preciso fazer mais. Devemos enfrentar o desafio de melhorar a vida dos mais de 23 milhões de brasileiros que vivem na Amazônia, região mais rica do país em recursos naturais, mas que apresenta os piores índices de desenvolvimento humano.

 A solução desse “paradoxo amazônico” é condição essencial para o desenvolvimento sustentável da região.

 Devemos aprimorar a governança da terra, bem como tornar realidade a bioeconomia, valorizando efetivamente a floresta e a biodiversidade. Esse deve ser um esforço, que contemple os interesses de todos os brasileiros, inclusive indígenas e comunidades tradicionais.

 Diante da magnitude dos obstáculos, inclusive financeiros, é fundamental poder contar com a contribuição de países, empresas, entidades e pessoas dispostos a atuar de maneira imediata, real e construtiva na solução desses problemas.

 Neste ano, a comunidade internacional terá oportunidade singular de cooperar com a construção de nosso futuro comum.

 A COP26 terá como uma de suas principais missões a plena adoção dos mecanismos previstos nos Artigos 5º e 6º do Acordo de Paris.

 Os mercados de carbono são cruciais como fonte de recursos e investimentos para impulsionar a ação climática, tanto na área florestal quanto em outros relevantes setores da economia, como indústria, geração de energia e manejo de resíduos.

 Da mesma forma, é preciso haver justa remuneração pelos serviços ambientais prestados por nossos biomas ao planeta, como forma de reconhecer o caráter econômico das atividades de conservação.

 Estamos, reitero, abertos à cooperação internacional.

Senhoras e senhores, como todos, reafirmamos em 92, no Rio de Janeiro, na conferência presidida pelo Brasil, o direito ao desenvolvimento deve ser exercido de tal forma que a resposta equitativamente e de forma sustentável às necessidades ambientais e de desenvolvimento das gerações presentes e futuras.

Com esse espírito de responsabilidade coletiva e destino comum, convido-os novamente a apoiar-nos nessa missão.

Contem com o Brasil".

Basta ver as ações de Bolsonaro e de seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para ver que algo não bate bem, não combinam palavras, discursos e realidade. Os líderes mundiais já viam com descrédito a posição e as ações do Brasil em relação a questão climática, e, com certeza não sentiram verdade nas palavras do presidente brasileiro. Joe Biden disse que os discursos do Brasil, da Argentina, da África do Sul, e da Coreia do Sul foram animadores, mas também afirmou que os compromissos precisam se tornar realidade.

A impressão é que algum assessor de Bolsonaro, sabe-se lá qual, chegou para ele e falou, “Presidente, não vale a pena partir para o enfrentamento com os líderes mundiais. Faça um discurso moderado” e foi o que ele fez, embora citando conquistas adquiridas em governos anteriores.

Mas, aqueles que não estão cegos pelo fanatismo, sabem que o Bolsonaro não é uma pessoa confiável, não é um homem de palavra. Ao contrário, as palavras e os atos do presidente mudam ao sabor do vento e das circunstâncias... E os ventos mudam muito rápido.

Para começar, nas vésperas da realização da Cúpula do Clima, tivemos o episódio do ministro Ricardo Salles demitindo o superintende da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva, e se colocando, abertamente, ao lado dos madeireiros ilegais. Salles também adotou medidas que dificultam ainda mais o trabalho de fiscalização dos funcionários do Ibama.

Um dia após Bolsonaro fazer promessas de se alinhar aos demais líderes mundiais, na cruzada contra a emissão de carbono, anunciando que aumentaria  os recursos para a fiscalização ambiental, eis que o presidente, no dia seguinte o presidente sanciona o Plano Orçamentário para 2021, e nele constava um corte de R$ 240 milhões para o ministério do Meio Ambiente.

Depois de tudo isso, o presidente ainda esperar receber uma ajuda de 1 bilhão de dólares para ações de combate ao desmatamento ilegal. Se esse dinheiro chegar ao Brasil no governo Bolsonaro, certamente, não irá para a finalidade para o qual foi solicitado. Provavelmente irá beneficiar não a floresta, mas os inimigos dela.


0 Comments

Postar um comentário

Copyright © 2009 Cottidianos All rights reserved. Theme by Laptop Geek. | Bloggerized by FalconHive. Distribuído por Templates