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A Vale do rio de lágrimas

Posted by Cottidianos on 23:39
Segunda-feira, 28 de janeiro


UM TSUNAMI DE LAMA. Este poderia ser o título desse artigo. Mas este blog resolveu trazer como título a causa e não a conseqüência. 
Esse é um daqueles textos difíceis de começar, pois ele trata de insensatez humana, de ambição desmedida tanto de empresas poderosas do setor privado quanto de agentes do setor público que angariam mais tesouros para os cofres públicos, e depois os utilizam em fins nada patrióticos ou humanos. É o que temos sabido e visto constantemente através dos noticiários que tratam do podre submundo da corrupção.
É ainda difícil começar quando pensamos nos danos ambientais causados. Mais uma vez, rios poluídos, atingidos grandemente em sua essência que é gerar vida e beleza por onde quer que passem. Ainda neste plano, entram as planícies e vales verdejantes aos quais eles irrigam e que proporcionam ao homem colher os mais ricos e saudáveis frutos da natureza. É triste pensar que, no lugar onde havia frutas e verduras nascendo, vacas mugindo no pasto, peixes nadando livremente em seu ambiente natural, o verdor característico da natureza em todo o seu esplendor, agora só existe um mar de lama de rejeitos de minério.
É também complicado abordar este assunto dado o grande número de vítimas. Vidas humanas ceifadas em uma tragédia de tão grandes proporções. Pessoas comuns, desenvolvendo suas atividades diárias, que, subitamente foram surpreendidas por um terrível mar de lama, a maioria delas sem a menor chance de se defender. Outras, muitas outras ainda tiveram chance de correr para um lugar mais alto, deixando, literalmente, tudo para trás. Era correr para longe o mais rápido possível, enquanto a lama feroz avançava implacável pelo vale.
Outro fato que torna difícil um começo de esboço de pensamento é o fato de estarmos assistindo a uma reprise de um filme de terror.
O cenário desta vez é Brumadinho. Minas Gerais. Uma verde região montanhosa na região metropolitana de Belo Horizonte.  O município foi agraciado pela natureza também com grandes mananciais de água. A água mineral por lá é abundante. O famoso Instituto Inhotim, um grande museu natural a céu aberto e que abriga um Jardim Botânico e expressivas obras e coleções da arte contemporânea do Brasil também fica no município.
Era por volta das 13hs da sexta-feira, 25, em Brumadinho. Tudo corria tranqüilo na empresa mineradora Vale do Rio Doce. Um grupo de operários trabalhava bem ao pé da Barragem do Feijão: uns em um ponto mais elevado e outros bem mais embaixo. De repente, os trabalhadores começam a notar que partes da estrutura começam a desabar. Uma ínfima parte começa a soltar pequenos pedaços na base, e, em questão de segundos, a imensa estrutura começa a ruir e acaba por se arrebentar de vez liberando um furioso tsunami de lama de rejeitos de minérios que avançam inundando o vale.
No caminho, o tsunami de lama encontra a área administrativa da mineradora Vale do Rio Doce, onde também funcionava o refeitório. No momento do rompimento da barragem, estavam nesta área, segundo informações da própria empresa, cerca de 300 funcionários e colaboradores. Também funcionava na área uma zona residencial e uma pousada. Impiedoso o tsunami engoliu tudo: pessoas e estruturas.
E seguiu seu caminho de morte destruindo casas e plantações, levando 13 milhões de metros cúbicos de rejeitos para o tranqüilo rio Paraopeba.        
Até o momento em que esse texto é escrito já são 65 o número de mortos confirmados. 279 pessoas continuam desaparecidas.
Em meio à tragédia, o presidente da Vale, Fábio Schvartsman, disse que o dano ambiental será menor do que o ocorrido em Mariana, mas a tragédia humana será maior. É o que tem se confirmado pelo número de vítimas até o momento.
Schvartsman assumiu a presidência da vale em 22 de maio de 2017, e em meio a muito blá, blá, blá, em um discurso a funcionários da empresa, afirmou que sua gestão seria focada em quatro pilares: desempenho, estratégia, governança e sustentabilidade. Pelo visto, alguns desses pilares não funcionaram, ou todos não funcionaram. Em conseqüência disso o que vimos foi mais uma tragédia de grandes proporções chocando o Brasil.
O lema adotado por Schvartsman para sua gestão — “Mariana nunca mais” —continha uma promessa que não se sustentou... A história se repete agora em Brumadinho.
Foi numa tarde de novembro de 2015, a barragem de Fundão, localizada no subdistrito de Bento Rodrigues, se rompeu e uma enxurrada de rejeitos de mineração cobriu casas e vegetação, e deixou a águas dos rios e mananciais impróprias para o consumo. A fauna e a flora da região ainda levarão muito tempo para se recompor. O crime, é melhor usar este termo, ao invés de acidente, deixou 19 mortos. Os povoados de Bento Rodrigues e Paracatu sumiram do mapa. Nada restou deles. A lama os soterrou por completo.
Há 3 anos e dois meses, vivíamos o drama de Mariana. Hoje, vivemos o drama de Brumadinho. Como na política, também estamos cansados de promessas de endurecimento da fiscalização no setor ambiental e de laudos que atestam uma coisa quando a realidade é outra.
Errar é humano. Insistir no erro é burrice.


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