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Um grito de justiça contra a intolerância racial e religiosa nas ruas da Moóca

Posted by Cottidianos on 23:32
Segunda-feira, 22 de junho
Tenho imagens lá em casa e não cometo idolatria
Eu vejo a luz
Uma coisa é uma imagem
E outra coisa é a pessoa de Maria
Ou de Jesus.
Imagem são sinais a me lembrar
Aonde Deus agiu
Imagem são sinais a me apontar
Por onde alguém seguiu
Imagem são apenas o que são:
Sinais sinais
(Imagens - Pe. Zezinho)

Na semana passada, mais precisamente na quinta-feira (18), um caso de intolerância racial chocou o mundo. Um desequilibrado mental invadiu a Emanuel African Methodist Episcopal Church, uma das igrejas evangélicas mais tradicionais da comunidade negra. O fato aconteceu em Charleston, no Estado norte-americano da Carolina do Sul. O jovem de mente doentia matou 9 pessoas, dentre elas, o pastor da igreja. E por que essas pessoas inocentem foram friamente executadas? Simplesmente por que eram negras.
Ainda no início da mesma semana, mais precisamente no domingo (14), um caso de intolerância religiosa chocou o Brasil. Uma menina de 11 anos foi apedrejada quando saía de um culto de candomblé, junto com amigos e familiares, na Vila da Penha, Subúrbio da cidade do Rio de Janeiro. Todos trajavam as características roupas brancas usadas pelos adpetos das religiões afros em momento de culto religioso. No trajeto para casa, foram abordados por dois homens, que, de Bíblia Sagrada em punho, loucamente, gritavam que o grupo era o diabo, que iam para o inferno, e que Jesus estava voltando. Não bastasse as agressões verbais, um deles apanhou uma pedra e atirou contra o grupo. A pedra, primeiramente, atingiu um poste de iluminação pública, depois rebateu e atingiu a menina na cabeça, provocando ferimentos físicos e traumas psicológicos.


É inadmissível que em plena era dos avanços midiáticoscientíficos e tecnológicos, aconteçam essas coisas. Algo está errado. Muito errado. Como dira Caetano Veloso, na letra da canção Fora de Ordem: “Alguma coisa está fora da ordem, fora da nova ordem mundial”. Algumas pessoas estão voltando ao medievalismo em pleno século XXI, e isso é preocupante.
No domingo (21) um ato ecumênico, com a participação de centenas de pessoas de várias religiões, foi realizado no Rio, em solidariedade a Kailane Campos, a menina apedrejada. 
Saindo das tragédias e da bestialidade humana, vou para a festa e para a celebração, sem sair dos temas inicialmente tratados.
 Neste domingo, aconteceu a Virada Cultural em São Paulo. Foram mais de 1500 atrações espalhadas por vários locais da cidade, com a participação de mais de um milhão e meio de pessoas. Haja fôlego para acompanhar tantas atrações. Neste evento houve coisas boas e coisas ruins. Coisas boas: a festa, a harmonia, a integração, os shows, a comida, vendida pelos ambulantes, as atrações culturais, a alegria. Coisas ruins: a degradação humana; havia, na madrugada, pessoas vendendo e pessoas consumindo drogas, em locais públicos, sem a menor cerimônia. Apesar disso tudo, nenhum crime violento foi registrado.
Eu também estive na cidade de São Paulo neste dia de domingo (21). Não participando da Virada Cultura, embora o evento do qual participei pudesse estar inserido nela.

Fui ao bairro da Moóca, na capital paulista, participar da 11a Procissão em homenagem e louvação ao orixá, Xangô. Nos cultos afro-brasileiros, Xangô é o rei da justiça. A entrada para o evento era feita mediante um quilo de alimento não perecível, para posterior doação à instituições de caridade.
Mais de duas mil pessoas, todas vestindo roupas brancas, lotaram o Ginásio do Clube Escola Moóca para participar de em evento que foi um misto de evento cultural com cerimônia religiosa. Na quadra do ginásio, o que se viu e ouviu foi muita música, percussão, hinos em louvação à Xangô, apresentação teatral e de dança. Fiquei particularmente, emocionado quando um grupo, com a participação de várias crianças, reviveu, no centro da quadra, os horrores e sofrimentos da escravidão. Também notei, nas paredes do ginásio cartazes contra o preconceito racial.
Na verdade, o evento em si era um grande grito por justiça, pelo respeito à diversidade religiosa e contra intolerância racial e religiosa. Os líderes umbandistas lembraram o fato do apedrejamento da menina carioca, e também relataram outros fatos de violência praticada contra os adeptos das religiões afro-brasileiras. Confesso que não sabia que os seguidores das religiões afros sofriam tanta violência física por parte de grupos radicais. Sabia que sofriam discriminação, que também é outra vertente da violência, por se tratar de uma violência psicológica.
A palavra de ordem dada pelos líderes era a de não revidar. “Eles (os agressores) são pessoas que não tem nada a perder. Nós (os da umbanda e do candomblé) temos. Então não se igualem ao nível dos nossos agressores. Denunciem aos órgãos competentes para que eles tomem as medidas cabíveis”, diziam eles. “Não são todos os evangélicos que agem dessa forma, apenas uma pequena minoria. Há evangélicos abertos ao dialogo”, acrescentavam. Isso me fez lembrar o ditado popular que diz: “Uma laranja podre estraga todo o cesto”. Isso vale para qualquer religião, como temos visto em relação às barbaridades criadas pelos radicais islâmicos.
Outro momento de grande emoção foi quando um grupo de dança fez a apresentação do orixá Xangô, em preparação ao ápice da festa: a procissão em homenagem a Xangô. O toque da curimba (atabaque), ecoando solene e forte, invadia o ginásio e tocava diretamente o coração do público presente. Enquanto o grupo de dança desenvolvia, em harmonia com o toque dos atabaques, passos coreográficos. Tudo de grande beleza.

Em seguida, os féis saíram pelas ruas do Clube Escola Moóca, seguindo o andor, no qual estava colocada, entre flores vicejantes, a imagem de Xangô. Todos, contritos, entoavam cânticos em louvação e homenagem ao orixá. A presença de muitas crianças dava um ar perenal à cena. Após um longo percurso, a procissão retornou ao ginásio para o encerramento final.
O evento foi criado, e é organizado, anualmente, pela Escola de Curimba e Arte Aldeia de Caboclos, cujo presidente é o Pai Engels de Xangô. Após o final do evento, Pai Engels, corria de um lado para outro orientando a equipe de organização, dando atenção às autoridades, convidados e fiéis da umbanda e do candomblé. Enquanto ele estava aqui e acolá, eu fazia marcação cerrada em cima dele. Se ele corria para a direita, eu lá estava. Se ia para a esquerda, eu o seguia. Se ela ia ao centro da quadra, eu o acompanhava. Tudo isso a fim de conseguir um breve depoimento, uma vez que entrevistá-lo como gostaria, era, naquele momento, quase impraticável.
Pai Engels de Xangô
Enfim, após algum tempo, e de muita boa vontade por parte do organizador, que, entre toda aquela correria, aceitou conversar comigo. Pedi-lhe então que, tendo em vista todos esses casos de violência e intolerância contra o povo da umbanda e do candomblé, deixasse uma mensagem ao blog Cottidianos. Diante de uma multidão que deixava o ginásio satisfeita com a homenagem a Xangô, rei da justiça, Pai Engels de Xangô, deixou a seguinte mensagem:
Minha mensagem é a seguinte: No início da procissão, eu relato que a maior parcela está no umbandista. Tudo bem que estão sendo radicias, estão sendo intolerantes, estão cometendo os maiores absurdos, com atos de violência física, inclusive, até o ponto que chegou de depredações, textos maldosos, vídeos e apologia, até em ginásios fechados, isso já existia. Mas a nossa parte é não negar a nossa religião, quando alguém perguntar quando os perguntarem, as pessoas assumirem: Eu sou umbandista, eu sou candomblecista, eu sou do culto aos orixás. Não negar sua religião. A gente não pode sair gritando para o mundo, mas também não pode negar a nossa religião, e muitos não a assumem.
A outra parcela, a segunda parte, eu digo que é fazer atos positivos. Convidar as pessoas para conhecer as confraternizações, os eventos, os encontros, os festivais, as procissões, para ver o quanto é bela a nossa religião. Fazer ações sociais, campanhas sociais para fazer as pessoas participarem e ver o quanto é belo, o quanto é positivo. E outro é que se acontecer um ato de intolerância, denunciar. Ir na polícia, fazer um boletim de ocorrência, notificar as demais instituições ligadas a religião de que isto está acontecendo, para que todo mundo fique atento e faça protestos contra a intolerância. Isso é o que a gente precisa fazer. A grande parcela está em nós. Não está só neles.
Inspirado nesse evento, e em todos esses acontecimentos de intolerância racial e religiosa que temos visto, escrevi um texto especial, porém, apresento-o na próxima postagem.

Boa semana a todos!

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