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Hélio, Rosely, caso Sanasa... E a dor de uma traição

Posted by Cottidianos on 00:04
Segunda-feira, 15 de junho



No ano de 2011, as manchetes dos jornais trouxeram grande decepção à população de Campinas. A dor no coração era semelhante à de quem tinha sido apunhalado pelas costas. A sensação era a de quem havia sido traído por alguém em que se tinha colocado grande confiança. Falo do caso SANASA, e do prefeito Hélio de Oliveira Santos.

Dr. Hélio estava em seu segundo mandato. Havia sido eleito pela primeira vez em 2004. Naquela ocasião, a cidade estava um caos devido a administração desastrosa da prefeita Izalene Tiene (PT), e o novo prefeito estava conseguindo colocá-la em ordem. A administração de Hélio estava agradando a grande maioria da população, que via nele um político honesto e trabalhador. Sua aproximação com o presidente Lula facilitava a obtenção de verbas para os cofres da cidade, possibilitando a realização de obras e projetos.

A prova de que Hélio era considerado um bom prefeito foi sua reeleição para um segundo mandato, com esmagadora maioria de votos, em 2008. Foi durante esse segundo mandato que investigações do Ministério Público revelaram o maior escândalo de corrupção jamais visto na história da cidade. O MP revelou que a primeira-dama e chefe de gabinete da prefeitura, Rosely Nassim Santos, era suspeita de chefiar um esquema criminoso, envolvendo pagamento de propinas em contratos da Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S/A (Sanasa). O processo resultou na cassação de Hélio, porém os envolvidos no caso ainda não foram julgados.

Em maio último, o processo voltou a tramitar no judiciário de Campinas. Está na fase de alegações finais, que é a etapa que antecede o julgamento. Nele estão envolvidos 22 réus e 60 testemunhas. No banco dos réus estão empresários e funcionários que eram membros do alto escalão da prefeitura à época de Helio. Ainda segundo investigações, o esquema de corrupção teria movimentado R$ 615 milhões. O julgamento do caso Sanasa deveria ter acontecido ainda em 2013, porém o processo estava travado devido a vários recursos interposto pelas partes.

Em minha postagem anterior, falei de amores que mudaram o mundo. Hélio e Rosely poderiam ter mudado o mundo para melhor, mas, ao invés disso, acabaram jogando no lixo, uma bela e vitoriosa carreira política. Gostaria de ficar frente à frente com os dois e perguntar: Valeu a pena tanta ambição de desonestidade?

Baseado no caso Sanasa, escrevi o texto abaixo.

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Hélio, Rosely, caso Sanasa... E a dor de uma traição

Prefeito Antonio da Costa Santos

O dia 11 de setembro de 2001 é tristemente lembrado pelo mundo como o dia em que o terrorismo ceifou milhares de vidas nos Estados Unidos com a tragédia envolvendo as Torres Gêmeas do World Trade Center. O dia 11 de setembro é dupla e tristemente lembrado em Campinas, pois na noite anterior, dia 10 de setembro havia sido assassinado o prefeito Antonio da Costa Santos, do PT, conhecido popularmente como Toninho. O prefeito, que havia assumido o mandato em janeiro daquele mesmo ano, era promessa de uma administração ética e justa, à frente da prefeitura da cidade.

Há fortes suspeitas de que o crime tenha sido político, uma vez que o prefeito estava contrariando interesses de grupos que, desde administrações anteriores, vinham obtendo vantagens ilícitas da administração pública. O assassinato de Toninho, até hoje, permanece envolto nos véus dos mistérios, nos quais estão escondidos os nomes dos verdadeiros mandantes e os reais motivos do crime.

Depois da morte de Toninho, a vice-prefeita, Izalene Tiene, assumiu o comando da prefeitura, fazendo uma péssima administração, e frustrando a população campineira.

Em 2004, ocorreram novas eleições. Diante da administração desastrosa de Izalene, qualquer um que ocupasse a vaga, com um mínimo de boa vontade faria um bom governo. Naquele ano, concorreram à prefeitura de Campinas, os seguintes candidatos; Carlos Sampaio (PSDB); Dr. Hélio (PDT); Zico (PT); Jonas Donizete (PSB); Fernando Quércia (PL); Ricardo Xavier (PSDC); Silvia Ferrari (PSTU) e Josias Abom (PCO).

Os candidatos Carlos Sampaio e Helio de Oliveira Santos levaram as eleições para segundo turno. Ideologicamente, o primeiro foi rotulado como o candidato dos ricos e o segundo como o candidato dos pobres. Diz o ditado popular que “a corda sempre arrebenta para o lado dos mais fracos”. Seguindo essa linha de raciocínio não se esperava uma vitória de Hélio. Havia ainda o fato de Carlos Sampaio ser branco e Hélio, negro. Os negros, como se sabe, são minoria em nossas casas legislativas, não por serem menos capazes intelectualmente, mas pelo estigma do preconceito.

Enfim, chegou o grande dia da eleição, 31 de outubro: a batalha final. Os dois candidatos passaram o dia percorrendo seus redutos eleitorais. Na manhã daquele dia, Hélio — ou Dr. Hélio, como ficou conhecido entre a população — foi à região do Campo Grande.  Visitou residência de eleitores, passeou pelas ruas da região. Tomou café da manhã em uma padaria, na qual tomou um delicioso café, acompanhado de um sonho — seu doce predileto. Tentava conquistar eleitores de última hora. Em outra parte da cidade, Carlos Sampaio, o grande favorito naquela disputa, fazia o mesmo em seu reduto eleitoral. Enquanto isso, os votos iam sendo depositados nas urnas, desenhando o rosto do verdadeiro vencedor. E as urnas, contrariando todas as expectativas, desenharam o rosto negro do Dr. Hélio, confirmando-o como novo prefeito, com quase 26 mil votos à frente de Carlos Sampaio.

Em 1o de janeiro de 2005, o sul mato-grossense, formado em medicina pela Unicamp, iniciou se mandato. Optou por um governo populista com fortes ligações com o governo federal, na pessoa do presidente Luís Inácio Lula da Silva, do PT. O presidente Lula era uma figura altamente carismática e ficar do lado dele era bom, tanto para a imagem do prefeito, quanto para os cofres da cidade. Prova disso, é que a cidade foi das que mais recebeu dinheiro do governo federal naquele período. Hélio trouxe novos investimentos para a cidade, e agradou a população. Passava a imagem de um político sério e integro. A cidade estava orgulhosa com o prefeito que havia escolhido. Em um panorama futuro, já se falava na eleição de Hélio para o cargo de governador do estado de São Paulo, ou quem sabe até, Presidente da Republica.

Vieram às eleições de 2008, e o prefeito, naturalmente, era o candidato perfeito a reeleição. Não havia dúvidas de que ele seria reeleito, como de fato o foi. A vitória de Hélio, em primeiro turno, nessa eleição foi esmagadora. Foram quase 294 mil votos de diferença entre o segundo candidato, Carlos Sampaio. Em terceiro lugar ficou Jonas Donizette, atual prefeito da cidade. A questão que se apresentava para os eleitores era se a segunda administração de Hélio de Oliveira Santos seria tão boa quanto a primeira. O que ninguém esperava era uma facada pelas costas. Uma traição.


A brilhante atuação política que o prefeito demonstrava veio abaixo com o mesmo estardalhaço com que ruiria um luxuoso prédio na Avenida Paulista... E, junto com a queda de Hélio, também veio abaixo nossa confiança nos políticos e nossos sonhos de uma cidade que via seu sol brilhar no horizonte de um plano político ideal.

Tudo começou no dia 20 de maio de 2011. Naquele fatídico dia, uma verdadeira força-tarefa envolvendo Ministério Público, Policia Militar e Corregedoria da Policia Civil cercou e invadiu o prédio da Prefeitura Municipal de Campinas. A operação contou com a participação de 130 policiais e 30 promotores. A polícia prendeu 11 suspeitos de estarem envolvidos em uma organização criminosa, que desviava recursos públicos, e praticava corrupção e fraudes em licitações da SANASA (Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S/A), em Campinas. No total, 20 pessoas tiveram a prisão temporária decretada pela Justiça. Dentre elas estavam empresários e altos funcionários da prefeitura. Nove delas foram consideradas foragidas. Entre essas pessoas estavam o coordenador de Comunicação, Francisco Lagos de Viana, o secretário de Segurança Pública, Carlos Henrique Pinto. O vice-prefeito, Demétrio Vilagra, só não foi preso porque estava em viagem de férias no exterior. Rosely Nassim Santos, primeira-dama e chefe de gabinete, só não foi presa porque, estranhamente, dias antes, havia obtido uma liminar para não sofrer medidas coercitivas. A medida também valia para o prefeito. Ele não estava sendo, diretamente, acusado, mas a medida beneficiou, em muito, a esposa.

Foi aí que percebemos que, por trás da face de bom moço do prefeito, havia um corrupto.

As máscaras foram caindo uma a uma. Era como se estivéssemos assistindo a uma novela. Cada dia tinha uma revelação diferente.

Hélio de Oliveira Santos e a primeira dama, Rosely

Ficamos sabendo que o alvo principal da investigação era a primeira dama, Rosely Santos. Ela era quem gerenciava o negocio sujo. Ela, comandava, pessoalmente, a rede de empresários e servidores envolvidos no esquema. Era também Rosely que organizava processos de concorrência para a SANASA, e também para empresas de segurança, conservação e limpeza.

Segundo depoimento de testemunhas, a chefe de gabinete e esposa do prefeito, recebia propinas que variavam entre 5% e 7% dos valores dos contratos.

As denuncias de corrupção, na verdade, haviam tido início em janeiro de 2011, quando Luiz Augusto Castrillon de Aquino, ex-presidente da Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento (Sanasa), sob acordo de delação premiada, revelou ao Ministério Público, o esquema de corrupção na empresa. Em abril, Rosely Santos havia sido intimada a depor no inquérito sobre o esquema de pagamentos de propina em contratos da Sanasa. Ela negou tudo.

No dia seguinte a prisão dos envolvidos no caso, os nove partidos da base aliada saíram em defesa dos funcionários da prefeitura e dos empresários. Alegavam eles o que agora alegam os dirigentes do PT, em relação aos envolvidos na operação Lava-Jato, e que já haviam afirmado antes em relação ao mensalão, ou seja, o de que todas as acusações não passavam de interesses de natureza política, cujo objetivo era desestabilizar o governo.

No dia 23 de maio, os 33 vereadores da Câmara Municipal, aprovaram a abertura de uma comissão processante, com o objetivo de avaliar o pedido de impeachment do prefeito. Três dias depois o vice-prefeito, Demétrio Vilagra foi preso quando desembarcava no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. O vice-prefeito voltava de uma viagem à Europa com a família.

No dia 02 de junho a primeira-dama foi, espontaneamente, ao Ministério Público, mas não falou nada sobre o caso. Diante das insistentes perguntas dos promotores ela preferiu ficar em silêncio. Ela foi submetida a uma acareação com o lobista Maurício Manduca. Junto com Rosely, Maurício era acusado de ser intermediário entre empresários e funcionários da administração municipal. Os dois negaram se conhecer. Mesmo assim, após a acareação, a chefe de gabinete preferiu pedir exoneração do cargo. Na ocasião, em nota, o prefeito atribuiu a renuncia da esposa a um gesto de “grande desprendimento”. “É um gesto de grande desprendimento, o objetivo da Dra. Rosely é preservar a administração pública”, escreveu ele.

No dia 09 de junho, o Ministério Público e Policia Civil, realizaram nova ação e prenderam o ex-secretário de segurança, Carlos Henrique Pinto e o ex-diretor da Sanasa Marcelo de Figueiredo. Ao todo foram expedidos sete mandatos de prisão, inclusive para o vice-prefeito, Demétrio Vilagra e para a primeira-dama, Rosely Santos. Os dois só não foram presos porque fugiram, permanecendo na condição de foragidos até o dia 15 de junho, quando o Tribunal de Justiça revogou os mandatos de prisão.

Enquanto isso, na Câmara de Vereadores de Campinas se desenrolava ao processo de impeachment. Por duas vezes, os votos contrários ao afastamento do prefeito saíram vencedores: primeiro em votação no dia 15 de junho, e depois, no dia 01 de agosto.

Os políticos do PT também saíram em defesa do “companheiro” Hélio, que era do PDT, mas durante o primeiro mandato, e também no segundo, sempre deu total apoio a Lula. Além disso, Demétrio, vice de Hélio, era do PT. Lula foi um dos defensores de Hélio, assim como José Dirceu. Os argumentos eram os mesmo de hoje: “Os adversários não brincam em serviço. Toda vez que o PT se fortalece, eles saem achincalhando o partido”, disse Lula.

O processo se desenvolvia e, cada vez mais, as testemunhas acusavam Rosely de ser a chefe do esquema. No dia 30 de junho, um empresário do setor, disse que era impossível a uma empresa ter seus projetos aprovados pela prefeitura, sem pagar propina aos funcionários públicos.

Em meio a tudo isso, o Ministério Público seguia sua luta pela cassação do prefeito. No dia 04 de agosto, a instituição pediu o afastamento e o bloqueio dos bens do prefeito, em ação civil pública por improbidade administrativa. O MP acusava o prefeito de não ter declarado duas empresas que possuía. Segundo os promotores, Dr. Hélio possuía duas propriedades rurais cadastradas como empresa no próprio nome. Uma delas era ligada a bovinocultura, e a outra, ligada a serviços de preparação de terrenos para o cultivo e a colheita. No momento em que declarou os seus bens a justiça eleitoral, o prefeito declarou as empresas apenas como fazenda. O juiz da primeira Vara da Fazenda Público negou o pedido do MP.

O clímax dessa novela deu-se no dia 20 de agosto, entre confrontos de manifestantes pró e contra a cassação. A sessão que culminou na cassação do prefeito foi longa e cansativa. Começou na quinta-feira (18), se estendeu pela sexta (19), e entrou pela madrugada de sábado. Finalmente, após 44 horas ininterruptas de uma longa sessão de julgamento, os vereadores, por quase unanimidade, cassaram o mandato de Hélio de Oliveira Santos, para alívio da imensa maioria da população campineira.

Após a cassação, a cidade passou a viver momentos de grande instabilidade política que, por consequência, levou também a momentos de instabilidade econômica.

No dia 23 de agosto, o vice-prefeito, Demétrio Vilagra (PT), assumiu a prefeitura... E começava outra novela: a da alternância de prefeitos.

Demétrio já assumiu o cargo pesando sobre ele a suspeição de envolvimento no esquema de corrupção que derrubara Hélio. Antes que se completasse um mês à frente da administração municipal, a Câmara de Vereadores resolveu afastá-lo do cargo, alegando que ele poderia atrapalhar as investigações. O cargo vago foi ocupado pelo então presidente da Câmara, Pedro Serafim Jr. Pedro ficou apenas dias na cadeira de prefeito, pois uma decisão judicial trouxe Demetrio de volta ao cargo. Enquanto isso, a população, confusa se perguntava: Afinal, quem governa a cidade?

Apesar da decisão judicial a Comissão Processante continuou seus trabalhos e, no dia 21 de dezembro, cassou o mandato de Demétrio Vilagra. Serafim voltou a sentar-se na cadeira de prefeito, com a missão de, em 90 dias, convocar eleições para eleger um prefeito que administrasse a cidade até o dia 31 de dezembro de 2012.

No dia 10 de abril de 2012, a Câmara Municipal de Campinas, realizou as eleições que escolheriam o novo prefeito. Foram candidatos os vereadores: Pedro Serafim Júnior (PDT), Arly de Lara Romêo (PSB), Antonio Francisco dos Santos (PMN) e o procurador José Ferreira Campos Filho (PRTB). Com 22 votos, Pedro Serafim foi o escolhido para concluir o segundo conturbado mandato de Hélio de Oliveira Santos.


O nome de Hélio não aparece na lista de envolvidos no esquema de fraudes do caso Sanasa. E nem precisava, afinal, tudo se passava ao lado da sala dele, tendo como chefe da quadrilha, sua própria esposa. Só um tolo não acreditaria que ele não sabia do esquema. Com isso, Hélio apagou, com a ajuda da esposa, uma estrela que poderia ter tido um iluminado brilho e dado grandes contribuições à política brasileira.

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